Posso vê-los todos, todos eles, festejando, bebendo vinho em transbordantes canecas esqueléticas,
Todos eles, os filhos do mundo, os pais do caos.
Impressionante ver como são esguios em forma quando vistos de perto,
Como se prendem numa caixa de horrores,
Festins disfarçados, a fantasiosa desgraça das trevas de um abismo,
Enquanto pensam estarem livres no paraíso.
Livres para voar com velhas e incandescentes ninfas sob o luar.
Do universo magistral já não os enxergo como gigantes, entre as estrelas seculares,
Aqui nada é tão grande quanto o frio da solidão, gélido-efervescente.
Posso ver os planetas, e eles estão todos gritando,
Apavorados.
Lá em baixo, insetos desesperados imersos no refluxo de uma decadência,
São os deuses do nada, que a nada temem senão a própria sombra.
Luzes e trevas, a corrida da alma maculada pela oscilação,
Oscilação que traz a carruagem vinda de um inferno sem brasas,
Fumaça, fumaça, onde está ela? O cavaleiro perde as rédeas de seu cavalo flamejante,
E está caído entre os mortos.
Todos festejam, todos bebericam o vinho transbordante em canecas esqueléticas,
Veja, veja! A terra gorgoleja! Estão vindo as erupções!
Raios mordem os asfaltos, como deuses furiosos resvalando, sem amparo.
São insetos varridos, varridos,
Varridos pela natureza.
Todos morrem, um por um, sob o céu cinzento de uma outra época,
Que agora retorna para julgar seus filhos,
Nas penumbras de uma realidade frustrada pelo fracasso.
Todos tombam,
É o fim.
Olhe daqui: lembra como eram grandes e esbeltos os insetos?
Lembra como cresciam, presos na caixa de horror a qual tanto aproveitavam?
Engraçado como, vendo daqui de cima, eles possam ser vomitados dos seios de seu próprio lar,
Exauridos pelos recursos aos quais desfrutaram como ratos quando em vida.
Agora veja daqui, entre estrelas, meteoros, cometas e todo o extraordinário jogo de luzes que se desenrola do escuro,
Veja além da órbita, além das fronteiras atmosféricas,
Além de tudo do que é palpável ou digno de ambição,
Além do solo gorgolejante e da tortuosa presença de parasitas,
Como eles parecem tão pequenos e insignificantes.
Por que os deuses estão dançando?
Por que lágrimas de sangue formam pantáculos exatos no espaço?
Acho que porque todos os insetos eram deuses,
E a vida não passava de uma dura e enfadonha piada mal contada.
Sempre fui leitor assíduo de histórias em quadrinho desde que me entendo por gente, e como todo fã da nona arte dotado de ao menos um pouco de visão crítica tenho me decepcionado muito com o rumo que a coisa tomou a partir do instante em que os super-heróis passaram a monopolizar o comércio e ditar costumes a serem seguidos na vida de todos os seus leitores.
Os quadrinhos se tornaram um veículo de alienação tão perigoso quanto à televisão. Hoje em dia pode-se dizer que a única segurança de se manter uma mente sã evolucionária está nos livros. Nos livros certos.
Vivemos moldados pela nossa época, limitados a um modelo de vida que nos transmite a falsa ideia de poder para esconder a certeza de que não portamos de fato esse poder, somos iludidos por uma razão carregada de inutilidade que está nos deixando cada vez mais débeis, impedindo que cresçamos conforme devemos crescer.
Pode-se dizer que levamos uma vida inteiramente artificial e sem propósito algum senão o de apenas viver e morrer como cobaias em fase de experimento, prestes a ser descartadas, porque não são nossos valores individuais os responsáveis pela nossa formação, mas influências externas dirigidas pelo império através da indústria.
As duas principais concorrentes que colocam o lucro na frente da qualidade são Marvel e DC comics, empresas americanas que se digladiam para ganhar dinheiro às custas de seus super-heróis em revistas extremamente caras que todos lutam para comprar a vida inteira devido à eterna continuação dos arcos. Os leitores (nerds em sua maioria) ficam presos nessa forma de consumo e morrem todos com seus egos inflados por almejarem as proezas de seus adorados super-humanos.
Não existe variedade nas aventuras de heróis. Existe uma única opção que se multiplicou para tomar o lugar da procriação artística e fazer com que lucrem em cima de artistas talentosos, tendo toda a originalidade barrada por um padrão de brigas aleatórias, um jogo de super-socos trocados por personagens com corpos de pugilistas que elimina a transmissão de qualquer tipo de conhecimento. Enchem as aventuras com tecnologia e experimentos científicos para fazerem o leitor pensar que está lendo alguma coisa inteligente, enquanto na realidade é a sua inteligência que está sendo sugada por esse amontoado de mentiras.
Me falaram uma vez que cultura pop não é conhecimento, e eu assino em baixo. Como os quadrinhos atuais são grandes contribuintes para a adoração dessa cultura mais voltada para o público jovem (por ser facilmente manipulado pela ótica teen), é um meio de envolver as pessoas com o consumo abusivo e à lavagem cerebral decorrente da falta de conhecimento, fazendo-o buscar desesperadamente adequações físicas e mentais para conviver com a micharia da sociedade.
Os heróis se repetem a um mesmo paradigma, estão presos numa mesma linha de raciocínio a qual não conseguem fugir e é tudo com o que estão nos entretendo: com nada. São os principais regentes do capitalismo, manipulam opiniões e reações em troca da manutenção de um dos maiores pilares da cultura pop.
Sofremos graves crises de atraso mental quando passamos a desejar o que esses deuses mascarados têm de incomum para parecermos melhores do que somos. O segredo está justamente nessa entrelinha: Os heróis são divindades adaptadas à sociedade em que vivemos para se tornarem arquétipos, aproximando assim suas características das características humanas e fazer com que todos queiram chegar o mais perto possível de se parecer com eles, desde o aperfeiçoamento físico à vantagem sobre-humana que pensamos ter em relação aos outros, mas na realidade continuamos os mesmos, cada vez mais imersos na burrice e tendo isso como vantagem.
Segundo os quadrinhos, heróis são herdeiros de proezas pertencentes a antigos deuses, portadores de um grande privilégio, o que tendemos a buscar por ser próprio do ser humano a fraqueza de se basear em divindades ou seres mais evoluídos que ele. Desde os primórdios o homem foi fiel a seus criadores, assim como a forças que estão além da sua compreensão ou de seu domínio.
Não se controla a busca pela aproximação do ídolo, queremos mostrar que somos como eles, que temos uma suposta personalidade por estar escolhendo algo que ninguém perto de nós escolheu para seguir, e por isso nos consideramos originais dentro do meio em que vivemos, não por uma personificação que desenvolvemos, mas por uma que a indústria nos obrigou a imitar para iludir-nos com a falsa originalidade.
Outro perigo de se basear nos vigilantes mascarados é a contração da tendência patriota que todos eles têm em comum, que é o que realmente faz deles vigilantes, o amor pelas suas pátrias, disposição para morrer por elas se for preciso e manter a ordem, o que já está estabelecido. “Ignoramos mudanças, estamos focalizados no que já existe e vamos lutar por isso, somos eternos escravos em uma dimensão psicológica da qual não temos conhecimento, e estamos felizes assim”. É o que querem que pensemos e façamos sem pestanejar. Manter as coisas como elas já estão para que nossos líderes não tenham problemas com anarquia e desordem.
Os heróis participaram de todas as grandes guerras da história, se alistaram no exército ou foram obrigados a estar lá diversas vezes, ou seja, influenciam pessoas do mundo inteiro a amar seu país e estarem aptos a defendê-lo quando seus reforços forem solicitados pelo governo. São deuses humanos vivendo em prol de seus governantes e influenciando toda uma geração a fazer igual, a amarem o império inconscientemente.
A indústria de quadrinhos empresta toda sua munição para Hollywood, e ambas lucram paralela e absurdamente em cima do que chamam de fazer arte. Alan Moore, um dos maiores nomes dos quadrinhos, criticou as duas. Os quadrinhos por estarem em decadência e terem perdido toda a qualidade que tinham antes do monopólio dos super-heróis sobrepor a variedade artística e atrofiar a todos como arquétipo, e Hollywood por portar um poder aquisitivo que poderia estar acabando com vários conflitos pelo mundo. É muito poder nas mãos de poucos, poder adquirido por intermédio da triste e dura esterilização artística.
Todos têm medo do novo, do sobrenatural, de tudo aquilo que está além da lógica restrita. Os deuses em geral são retratados com a aparência humana ou de animais, eles precisam ser naturais para não parecerem assustadores a olhos nus, para não levarem seus seguidores à loucura do incompreensível. No caso dos super-heróis, são naturalmente humanos para induzir em seus leitores comportamentos que favorecem os princípios imperialistas, como a questão do patriotismo a qual tratamos.
É perigoso pensar que somos alguém dentro da sociedade, que temos peso na história ou geramos influência para várias pessoas juntas, porque esse falso senso de grandeza, embora pareça funcionar dentro dos nossos objetivos, nos prende automaticamente no círculo vicioso da hierarquia, nos torna submissos a processos iguais a esses que pensamos dominar.
Até os governadores hoje em dia dependem de uma força superior, não existe um ápice para a pirâmide hierárquica se analisada em um espectro mais amplo. O Sistema alcançou tal nível de monstruosidade que chegou no ponto de depender da interação de seus órgãos para agir.
Nenhum homem ou órgão administrativo desse mundo tem poder suficiente para fazer o que bem entender, só no universo dos super-heróis.
Nada mais me impressiona,
Com nada mais preciso me preocupar,
Os vermes transitam na escuridão
Sem sair de seu lugar.
Se este é o paraíso dos comuns,
Prefiro cair em seu inferno,
Lugar dos desordeiros isolados,
Onde nunca há inverno.
Mas enquanto aqui, me isolo,
Me escondo,
Escorrego pela garganta do colosso
E espero alcançar os longíquos recônditos.
Não é bonito se vestir com roupas,
Não é bonito estar entre as pessoas,
Não é bonito comer nem andar,
Não é bonito se sacrificar.
No lar dos condenados,
Todos são ases da própria escuridão,
Vivem como lacaios,
E assim terminarão.
Veja as múmias de gravata nos passeios,
Veja o medo de seus olhos exalando,
Sitiados na peculiaridade,
Adornados pela superficialidade.
Eles não merecem a minha atenção,
Estou me lixando pelos seus chamados,
São tão somente escravos,
Na ortodoxia dos condenados.
Eu sou a sombra em pleno dia,
A luz em plenas trevas,
Não me misturo, não me perco,
Nesse ninho de piegas.
Quando olho ao redor já não vejo os amigos que via antigamente ao meu lado à minha inteira disposição. Não posso afirmar que algum dia já os tive de verdade porque muitos dos supostos amigos que nos circulam estão ao mesmo tempo elaborando macetes maquiavélicos para nos derrubar no outro dia, quando tiverem o apoio necessário para nos abater com precisão. E além do mais, o mundo é uma esfera que nos prende na ilusão de que sempre teremos alguém para recorrer ou mesmo derramar lágrimas de tristezas sobre seu peito quando mais precisarmos. O próprio mundo é um orbe banhado de agonia, e relativamente um chuveiro vomitando a água da mentira em cima dos que nele se situam com uma noção distorcida do que é o “viver intensamente”, o tão irrefutável e aproveitador modo de vida que todos adotam como o ponto crucial de um relacionamento. Mas estão enganados, todos eles. Como somos criaturas asquerosas e desprezíveis para a nossa própria geração, temos de passar pela mais inexplicável experiência de nos adaptar a um estilo de vida que varia de tempo em tempo.
Deus é um menininho terno ouvindo música enquanto destrói seu playmobil sem a mínima sobriedade de consciência, trocando constantemente os discos na medida em que vão terminando suas faixas. E por que não chamarmos de Deus esse ser superior ao qual somos tão gratos por respirarmos naturalmente durante em média cem anos e caminharmos num lugar tão amável quanto esse planeta de gorilas modernos? As pessoas gostam de dar nome aos bois, então vamos dar nome àquele genitor que provavelmente está pouco de lixando para o que acontece a seus originários. E estamos tão preocupados com ele que deixamos de enxergar a nossa própria realidade, de fazer coisas para mudar essa realidade injusta. Não, em vez de nos mexermos nos mantemos parasitas de nós mesmos, encapsulados num aquário lacrado que já começa a transbordar e estamos pedindo a Deus por cada um dos nossos atos, atos que nunca são feitos porque Deus se recusa a respondê-los em sua onipotência. As pessoas salientam símbolos que terminam por escravizá-las, assim acontece com o jogo de viver ao qual pensamos estar fazendo o melhor, enquanto na verdade cagamos numa latrina isolada da razão.
As pessoas precisam dos símbolos para ser felizes, e os símbolos precisam de sua admissão para escravizá-las, a qual concedem com todo o prazer. Ignorância já! A pior ignorância de que sem conhecimento, a ignorância de um louco masoquista se mutilando dentro de um asilo, sofrendo o inferno pelas suas próprias mãos e ao mesmo tempo satisfazendo uma necessidade doentia.
A verdade é que não temos amigos. Nenhum de nós. O que temos são pessoas mascaradas participando de um baile à mercê da tão temida Morte, como no conto de Allan Poe. Todos usam máscaras, ninguém é real no que se diz respeito à sinceridade e ninguém está disposto a se revelar com medo de uma quebra na organização já estabelecida de uma sociedade. Quem se arriscar, quem revelar seu caráter genuíno, este que as indústrias, máquinas e uma mecanização cerebral não pôde corromper, pode ser banido de seu amado e costumeiro meio de mentirosos.
O homem que vence a própria época deixando a máscara cair de seu rosto está fadado a se libertar, mesmo longe dos amigos que exigiam dele atitudes voltadas para a moda, e é justamente esse distanciamento de outras pessoas que mostra ao ser humano o limiar da liberdade fora do sítio social, a solidão, para que ele seja capaz de conhecer a si mesmo. Devemos ter cuidado com nossos inimigos, mas precisamos dobrar esse cuidado quando se trata daqueles que se dizem nossos amigos, para fingirmos como que numa peça teatral dispormos de uma confiança paralela a eles.
Não existem amigos, existe uma rede de convivência que conecta unidades para diversos fins, como a estrutura principal de um microchip. Todos são pretensiosos, ninguém é irmão um do outro porque a religião e a moda assim estabeleceram e dividiram.
Hoje vou contar para vocês, meus caros amigos e leitores ocasionais, a triste história de um verme habitante de uma metrópole meio conturbada para a vivência de seu pobre e moribundo ser.
Esse desastroso personagem era exatamente o que todos nos dias atuais chamam de nerd, isto é, propenso a uma perigosíssima doença psicológica que põe em risco a vida social da pessoa e ironicamente sua inteligência genuína, transformando-a em um computador ambulante capaz de armazenar uma quantidade espantosa de informações distorcidas pelo ensino porco da atualidade juntamente ao Sistema de alienação massiva. Seu nome? Jacinto Pinto, a escória humana pisoteada diariamente pelos valentões de peitos largos do colégio, obrigado a pagar lanche para eles na hora do recreio se quisesse ver sua pequena cabecinha triangular em cima do pescoço que mais aparentava um palito de dente sufocando o nítido pomo de adão que subia e descia com frequência.
Jacinto era tudo de ruim (não pense que essa história vá terminar igual ao patinho feio), tinha todas as doenças que você pode imaginar somadas à fobia social e o medo, horror, repúdio por mulheres. Se bem que elas nunca o deram atenção suficiente para que um desejo maior fosse despertado nele. Não tinha amigos confidentes, não tinha um carro como a maioria dos jovens de sua idade, estava sempre pensando além dessas coisas.
Uma vez o visinho Fred estava lendo quadrinhos na varanda de sua casa quando do nada ouviu uma espécie de motor bem incomum assobiando um barulho esquisito que nenhum automóvel jamais fez. O pai de Fred era mecânico, e não obstante o filho tinha um conhecimento hereditário no assunto. Ficou curioso e foi checar o que era, e quando chegou na grade adornada por caracóis delgados de aço preto, se viu literalmente no meio de uma selva atrás dos ornamentos abstratos do portão, porque logo soube que o que vira naquele dia jamais seria esquecido por ele. Jacinto se via dentro de uma nave espacial testando o motor, tampado pelo visor reluzente de cristal sintético brilhando feito diamante sob o sol, Fred meio que visualizou a silhueta do rapaz dentro da coisa colossal que ultrapassava uns quatro metros o telhado da residência.
E permaneceu ali paralisado pela coisa de asas redobráveis tentando pensar como um jovenzinho besta de meia tigela construiria algo assim de maneira aparentemente tão simples. Quando o assobio mecânico do motor foi desligado, correu como um louco de volta para sua casa e se atirou na cama ignorando os quadrinhos na varanda, porque o que ele viu no quintal de um visinho que por tantos anos parecia tão normal e inofensivo criou uma espécie de inibição em sua cabeça para com histórias de ficção científica. Ele nunca mais assistiu a um filme em sua vida, nem leu mais nada até que os anos foram deixados para trás e o transformaram num velho traumatizado, com medo de ler qualquer história que trouxesse naves espaciais assobiando visualmente pelas onomatopéias.
Teve aquele agente imobiliário também, que ao fechar negócio com os pais de Jacinto sobre a casa a qual estavam comprando na tranqüila e arborizada avenida perdeu o emprego e consequentemente a vida depois de ver o que viu. O pobre coitado saiu mais fulo que égua manca após se deparar com um espaço cheio de estrelas tremeluzentes e planetas coloridos ao puxar a maldita maçaneta que dava para o quarto de Jacinto.
Como a família havia parcelado o preço da casa, haviam morado nela por um bom tempo antes de concluir o pagamento, então fizeram algumas modificações, sendo elas troca dos papéis de paredes, pintura nova, ladrilhos e boxes para os banheiros...
Jacinto fez de seu quarto um ambiente espacial, inserindo estrelas moldadas por uma fôrma de picolés que havia ganhado na infância pelos tios e criou sistemas de iluminação similares aos de pisca-pisca em cada estrelinha que obteve com metal derretido.
Fez uma porção de orbes com cartolina dobrada e os sitiou com anéis de argolas de plástico e o resultado foi nada mais nada menos que planetas perfeitos. Ao fundo, na parede, colou pôsteres de tanto modelo de nave espacial que o quarto ficou parecendo mesmo o universo como cenário de uma odisséia cósmica, mas espere, ainda não acabou! No vértice inferior direito do esquema do quarto que terminava no rodapé, além de traçar parcialmente a borda do globo terrestre, conseguiu complementá-lo com um panorama 3D e pintar a América anglo-saxônica contornada por néons verdes de diversas tonalidades, e a frase “venha para cá” escrita em vermelho.
Instalou sistemas de ar condicionados de maneira estratégica para o visitante sugar o friozinho pelas narinas com um certo excesso que fazia qualquer um passar mal. Debaixo do assoalho montou um gerador de energia eólica para que o visitante se sentisse, mesmo com os pés no chão, flutuando na imensa rede espacial que só se tornou tão imensa porque surgiu de um recinto microscópico caindo aos pedaços. Era o efeito da gravidade.
Agora imagine como o agente imobiliário se sentiu ao se deparar com essa loucura toda. Pediu demissão no dia seguinte e nunca mais quis visitar seus parentes pais de filhos intelectuais, o que envolvia 2/3 de sua família. Todos o desconsideraram pela ausência familiar em festas e comemorações e ele morreu sozinho de ataque cardíaco, com a cabeça enfiada na privada.
Como você deve ter percebido, a figura do nerd como esta tem se afirmado nos dias atuais com todo esse desenvolvimento tecnológico é uma ameaça crítica para todos, porque além de sua capacidade absurda de criar o inimaginável dentro dos parâmetros sociais ao qual estamos acostumados, são seres extradimensionais se apossando de humanos para criar através deles um mundo supermoderno ao qual sua raça mais tarde desfrutará como alguma espécie de laboratório. Porra, que hipótese nerd! Claro que estou brincando! Jacinto era doente como citei no início do texto, cabeção.
Bom, aqui nos despedimos de Jacinto Pinto, esse personagem ridículo, que a propósito morreu assassinado por um primitivista fanático a tiros no umbral da porta da casa, sob os pés de seus chorosos pais.
Hoje acordei meio irritado, com raiva do mundo.
Quando você começa a ver determinadas coisas que ninguém mais vê além de você, impulsionado pela maravilhosa proeza que é o interesse, você começa a enxergar um mundo transfigurado, as cortinas se separando para dar início ao espetáculo, a redoma do relógio de parede se abrindo revelando todas as engrenagens e mecanismos padronizados para exercer a função debaixo do que a olho nu parece ser tão simples... Então vem a irritação. Irritação pelo mundo que vemos funcionar sem saber quais são suas engrenagens, você dorme num dia e acorda o mesmo no dia seguinte buscando sempre o tédio e o regresso. Irritação pelo conhecimento da inutilidade que é a busca do ser humano pelo nada eterno. Quem é você afinal? O que você quer?
Filósofos afirmam que o que você come é irreal, psicólogos te analisam e da noite para o dia desvendam uma série de patologias contidas na sua cabeça. Sua maior doença te prende numa caixa de sapato jogando restos de alimento para você sobreviver desde que seja uma formiga ortodoxa disposta a aceitar o que quer que seja veiculado através da propaganda.
Nascemos homens e mulheres, mas nos tornamos com o passar do tempo uma porção de máquinas de xérox reproduzindo tudo o que é original, pois durante a vida inteira somos movidos pelo que os outros pensam e ignoramos a nossa própria capacidade de pensar, logo, não pensamos. Somos eternas sementes atrofiadas incapazes de germinar, infindáveis aspirantes do desconhecimento. Estamos longe de conhecermos a nós mesmos.
E o que somos além de robôs explorados por uma carga horária absurda para comermos o pão de cada dia? Aparentemente temos uma democracia, mas o aparente foi encaixado nos nossos rabos como se fossem modems piscando sem parar, e aceitamos tudo como se fossem as mil maravilhas.
Somos tão presos às nossas rotinas e cegos pela pressão excessiva a qual sofremos que simplesmente temos medo de combatê-los, somos máquinas ignorantes suprindo nosso real objetivo com o objetivo que outros têm às nossas custas. Não somos nada. Nada para nós mesmos.
Saio às ruas e o que vejo são máquinas transitando pela cidade, como nos filmes de ficção científica. O carteiro de bicicleta joga o jornal sobre a cerca do vizinho e ele ricocheteia na grama. O vizinho sai para apanhá-lo depois de um curto período de tempo, após saborear o delicioso café da manhã com pães e granolas no leite fresco, enquanto essa reação estereotipada se repete em praticamente todos os cantos do planeta Terra onde há organizações civis.
O nerd obeso se senta atrás da televisão com uma barra de chocolate Nestlé e aos poucos vai mordiscando, sentindo a serotonina escorregando pelo cérebro e engordando cada vez mais, porque o consumo é atribuído majoritariamente aos anti-sociais de baixo auto-estima, que como não têm o que fazer, buscam refúgio nas compras.
Pobres jovenzinhos se dizem donos de personalidades próprias quando se adentram em grupos que só aumentam o grau de domínio das indústrias sobre eles. Começam a se vestir como dita a moda e perdem o direito sobre o próprio modo de enxergar as coisas, perdem o propósito no mundo.
O futebol está criando pessoas burras e alienadas sem a menor noção do que estão fazendo no mundo, ao passo que marcas estão sendo vendidas através do mesmo.
Esse é o nosso mundo mecanizado, nosso relógio lacrado nas bordas e enquanto alguns de nós são os números, outros são as engrenagens. E sobretudo os ponteiros indicam os poderosos, e o idiota que fez esse mundo de vermes descerebrados é a cobertura invisível por cima das nuvens, além do nosso alcance.
Estou sozinho nessa madrugada escura, só eu, eu mesmo e meus cinco sentidos desativados pela falta de vontade de usá-los. Mergulhado na neblina eu sou um boneco de pano sentado na droga de um banquinho de madeira da única praça pública que freqüento e não tem mais ninguém. Nem o vento assobiando ou radiolas cantando o blues de Bob Dylan enquanto pessoas de bom gosto inserem moedas na abertura da máquina pedindo bis. Nem a luminosidade dos postes está comigo.
As coisas já não são mais como eram antes, os fantasmas são outros. Idéias diferentes tomam a minha cabeça, gosto por outras mulheres, por aquelas que vivem uma vida sofrida como a minha ou já tiveram acesso às mesmas feridas que eu pude tão indesejadamente sentir na corrida do tempo dentro do corredor que eu costumo chamar de vida. Esse corredor horrendo que me trouxe à força para essa época de hipócritas desastrosos.
As mulheres são criaturas cruéis, mas eu nunca as culpei por isso. Existem sempre homens dispostos a inflar seus egos de maneira programada ,automatizada. Homens têm mania de pensar que o bem estar feminino deve ser mais privilegiado que o masculino, como se a prioridade fosse um volante capaz de girar para um só lado e tomar uma única curva. Estão redondamente enganados, e ficariam até putos se tivessem uma gota de percepção para enxergar o quanto pagam pau sem causa alguma.
O mundo é esse caos por causa das mulheres, logo, dos homens. Claro que há machões discordando dessa afirmativa porque a única coisa que sabem fazer é pegar aquela garota a qual elogiou durante tantos anos para juntos alimentaram uma “amizade” predestinada à artificialidade do amor moderno.
Ora, o que é o amor? Dou a minha cabeça numa bandeja se alguém apresentar provas reais de que é essa merda movida a todo esse sentimento ilusório venenoso que faz as pessoas pensarem que estabelecem entre si algum tipo de vínculo.
Pare de amar. Amar é para os trouxas.